Uma mulher em um dia quente saí de casa com uma saia – curta, porém nada fora do comum – e uma camiseta simples. Os homens que passam por ela certamente vão olhar… Uns apenas isso, outros soltarão palavras que muitas vezes irão soar violentas. Elogios que passam do limite e extrapolam para uma intimidade que não existe.

Essa mesma mulher volta para sua casa à noite, sozinha, e ao se aproximar de casa um homem a impede de entrar e a obriga a satisfazê-lo sexualmente. Quem é o responsável por isso? Ela, que estava de saia curta – poderia estar de calça e a situação ser a mesma – ou o sujeito que, além de interferir na vida da mulher de maneira estrondosa, a obriga – muitas vezes ameaçando com armas, sejam elas letais ou não – a realizar seus desejos sexuais?

O responsável pela violência sexual é o próprio violentador e ninguém mais.

Artem Furman/ShutterStock

Artem Furman/ShutterStock

Numa sociedade pós-moderna, século XXI, em que o acesso a tecnologia está cada vez mais presente em todas as classes – o processo é lento, mas já chega a diversos lugares antes inalcançáveis – fazendo com que quase toda a população tenha a possibilidade de se informar e descobrir um pouco mais do mundo ao seu redor. É um tanto assustador saber que 26% dos brasileiros ainda pensam que “mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas”.

Segundo estudo do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), onde foram entrevistadas 3.810 pessoas entre maio e junho do ano passado, a maioria dos brasileiros ainda considera a mulher como responsável pela violência sexual. Jovens e moradores das regiões sul e sudeste têm menos chances de culpar o comportamento feminino pela violência. A chance também é menor à medida que aumenta o nível educacional do entrevistado. Católicos têm chances 1,4 maior de concordar total ou parcialmente com a afirmação. Entre evangélicos, a chance é 1,5 maior.

Além disso, segundo o mesmo estudo, as crianças e adolescentes são 70% das vítimas de estupro do sexo feminino. O que gera uma conseqüência ainda maior, falando principalmente em termos psicológicos. O processo de auto estima, que se constrói nessa fase, pode ficar corrompido gerando comprometimentos nos relacionamentos sociais futuros desses indivíduos. E nesse caso, não há como dizer que a culpa são das roupas curtas.

Os registros do Sinan demonstram que 89% das vítimas são do sexo feminino e possuem, em geral, baixa escolaridade. Do total, 70% são crianças e adolescentes. “As consequências, em termos psicológicos, para esses garotos e garotas são devastadoras, uma vez que o processo de formação da autoestima – que se dá exatamente nessa fase – estará comprometido, ocasionando inúmeras vicissitudes nos relacionamentos sociais desses indivíduos”, aponta a pesquisa.

Na década de 80 uma pesquisa, com o mesmo intuito, apontava dados parecidos, o que digamos, seria no máximo aceitável para a época. Mas hoje, passados mais de 30 anos, se vê que o desenvolvimento da sociedade em relação à emancipação da mulher permanece estagnado.

Infelizmente, o Brasil ainda possui uma grande parcela de pessoas sem letramento. Diante disso, de nada resulta a tecnologia estar à disposição. O que prevalece como formação do indivíduo é a mídia televisiva, já que é o meio que mostra e diz por uma tela no sofá da própria casa, sem que essas pessoas precisem filtrar as informações.

Muitas vezes essa mídia está corrompida. Retratando a ideia da mulher objeto, principalmente, em propagandas de cervejas, carros e nas novelas. Por que ninguém questiona um homem de bermuda e sem camisa na rua e sim mulheres que andam de minissaias e camisetas?

Por outro lado, a pesquisa do Ipea, também, revelou que a sociedade defende a punição aos agressores. 91% dos entrevistados concordam parcial ou totalmente que “homem que bate em esposa tem que ir pra cadeia”. Entretanto, ainda é preciso bater na tecla de que a mulher é a vítima nessa história toda.

Fontes:

Terra

IPEA

BBC

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